Cinema ao Pé da Letra – Parte 18: – Os Ângulos de Câmera: A maravilhosa arte de fazer o espectador se sentir inferior… ou não

Pedro Lauria

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29 de setembro de 2013

Oláááááaá enfermeira!
Eu simplesmente não posso casar com uma enfermeira. Se não ela vai sofrer. MUITO. Culpa dos Animaniacs.
Mas por qual motivo, razão ou circunstância, eu estou falando desse desenho no início de uma coluna sobre cinema? A resposta é simples: eu estava com isso na cabeça. As vezes as coisas não tem sentido.
Deal with it.
Quer dizer. Menos no cinema. No cinema tudo precisa fazer sentido. Cada posicionamento de câmera, ângulo, item de decoração ou vestimenta de personagem…
Na última coluna já falamos sobre o tamanho dos planos. Porém, esta não é a única informação captada pelo espectador quando vê um plano: o ângulo em que a câmera se posiciona também interfere em como vamos compreender a cena (ou o plano). E é isso que vamos ver hoje, Ângulos de Câmera.

Plongée

Plongée vem do francês “mergulho”. Logo, se diz do plano em que a câmera está posicionada em cima e apontada para baixo. Como se estivesse mergulhando. Os planos plongée geralmente criam um sentido de inferioridade no personagem que está sendo retratado, pois emula a visão de um adulto olhando para uma criança.

Os leve contraplongée empregado nesta cena de ET, nos ajuda a perceber como o garoto tem uma posição de poder e influência sobre a irmã mais nova. Entre os dois, ele é o adulto.

O leve plongée empregado nesta cena de ET, nos ajuda a perceber como o garoto tem uma posição de poder e influência sobre a irmã mais nova, que aparece reduzida em plano. Entre os dois, ele é o adulto.

Contraplongée

Obviamente, é a situação inversa do Plongée. Aqui, a câmera se encontra embaixo e posicionada para cima. O sentido também é o inverso. O Contraplongée emula o olhar de uma criança (dominada, subalterna) para um adulto (dominante).

Os caras do "Homens de Preto" são profissionais em sua área, tomam conta de qualquer situação, logo, enquadrá-los em um Contraplongée nos ajuda vê-los como poderosos.

A dupla de Homens de Preto é profissional em sua área de trabalho, podendo tomar conta de qualquer situação, logo, enquadrá-los em um Contraplongée nos ajuda vê-los como poderosos.


Para ajudar a criar o monstruoso Bane de O Cavaleiro das Trevas Ressurge, Christopher Nolan empregou do constante uso de Contraplongée para ajudar a mostrar sua dominância. Veja, no exemplo acima, como um simples posicionamento de câmera (aliado ao tamanho do plano) cria um ser amedrontador.

Para ajudar a criar o monstruoso Bane de O Cavaleiro das Trevas Ressurge, Christopher Nolan empregou do constante uso de Contraplongée para ajudar a mostrar sua dominância. Veja, no exemplo acima, como um simples posicionamento de câmera (aliado ao tamanho do plano) cria um ser amedrontador.

Plongée vs Contraplongée

Para deixar ainda mais clara a diferença entre o Plongée e o Contraplongée, vamos pegar duas personificações de um único personagem: Adolf Hitler.

No clássico O Triunfo da Vontade, Leni Riefenstahl procura criar um retrato mítico de Hitler. Tal qual o posicionamento de câmera acima mostra, Hitler é mais do que uma figura paterna - é um ser quase divino.

No clássico O Triunfo da Vontade, Leni Riefenstahl procura criar um retrato mítico de Hitler. Tal qual o posicionamento de câmera acima mostra, Hitler é mais do que uma figura paterna – é um ser quase divino.


Já em A Queda! As últimas horas de Hitler, o leve Plongée é usado pra criar um retrato mais fragilizado de Hitler. Algo ajudado pela presença de pessoas a quais não vemos o rosto a sua volta. (Uma estratégia similar a usada em Tom e Jerry e em A Vaca e o Frango).

Já em A Queda! As últimas horas de Hitler, o leve Plongée é usado pra criar um retrato mais fragilizado de Hitler. Algo ajudado pela presença de pessoas a quais não vemos o rosto a sua volta. (Uma estratégia similar a usada em Tom e Jerry e em A Vaca e o Frango).

Zenital (ou “Os Olhos de Deus”)

Zenital vem de Zênite, um termo astronômico para indicar um ponto imaginário presente na esfera celeste, traçada a partir da cabeça do seu observador. Ou seja, no cinema é quando a câmera se posiciona no céu e é virada praticamente em 90 graus em direção a Terra. Quase como se fosse um deus, lá do céu, olhando para os seres humanos.

Em Fargo, esse plano é utilizado por uma série de motivos. Entre eles, mostrar a pequeneza do ser humano (que se meteu em uma confusão absurda) frente aquela imensidão branca que simboliza a cidade de Fargo e, para que os Coen possam fazer uma brincadeira simbólica. Está vendo o caminho que o carro faz na neve? Uma cruz, ou uma encruzilhada, algo que simboliza perfeitamente o momento em que o personagem está passando.

Em Fargo, esse plano é utilizado por uma série de motivos. Entre eles, mostrar a pequeneza do ser humano (que se meteu em uma confusão absurda) frente aquela imensidão branca que simboliza a cidade de Fargo e, para que os Coen possam fazer uma brincadeira simbólica. Está vendo o caminho que o carro faz na neve? Uma encruzilhada, algo que simboliza perfeitamente o momento em que o personagem está passando.

Nadiral (Os Olhos do Morto)

Em astronomia, é o contrário do Zênite. O que indica um posicionamento de câmera também contrário. Imagina o ponto de vista de uma pessoa dentro de seu caixão, já embaixo da terra. Esse é o plano Nadiral.

Em O Cavaleiro das Trevas Ressurge, o plano Nadiral é usado para mostrar, literalmente, a luz no fim do túnel. A esperança do Bruce Wayne em conseguir sair daquela prisão-poço.

Em O Cavaleiro das Trevas Ressurge, o plano Nadiral é usado para mostrar, literalmente, a luz no fim do túnel. A esperança do Bruce Wayne em conseguir sair daquela prisão-poço.

O Nadiral e o Zenital em nossas vidas

Apenas pra dizer que a vida imita a arte e vice-versa.

Em Curtindo a Vida Adoidado, os personagens, no topo de um arranha-céus, conversa sobre como lá de cima as pessoas e os seus problemas parecem mínimos. E realmente, isso é trazido para o âmbitos das religiões quando se diz dos deuses todo poderosos que moram no céu e nos vêem lá de cima.

Em Curtindo a Vida Adoidado, os personagens, no topo de um arranha-céus, conversa sobre como lá de cima as pessoas e os seus problemas parecem mínimos. E realmente, isso é trazido para o âmbitos das religiões quando se diz dos deuses poderosos que moram no céu e nos vêem lá de cima.


Sabe por qual motivo as igrejas tem o pé direto (altura do chão até o teto) gigantesco e os seus afrescos ficam todos lá no alto? Para obrigar você a olha pra cima - em um visão Nadiral que reforça o quão pequeno você é frente a imensidão da igreja/da divindade.

Sabe por qual motivo as igrejas tem o pé direto (altura do chão até o teto) gigantesco e os seus afrescos ficam todos lá no alto? Para obrigar você a olha pra cima – em um visão Nadiral que reforça o quão pequeno você é frente a imensidão da igreja/da divindade.


 

Plano Holandês

Por fim, o plano inclinado (ou holandês). É usado para mostrar uma mudança de perspectiva ou um desequilíbrio.

Já que estamos falando de Holanda... Em um Homem Sério, o plano holandês é usado para mostrar a mudança de perspectiva que o protagonista tem quando começa a fumar maconha.

Já que estamos falando de Holanda… Em um Homem Sério, o plano holandês é usado para mostrar a mudança de perspectiva que o protagonista tem quando começa a fumar maconha.


 
E se eu comecei com Animaniacs, me dou o direito de terminar com Looney Tunes.
Por hoje é só, pessoal!
Ps: Presentinho – uma montagem com vários filmes empregando o Plano Zenital. Vale a pena assistir.

 

Pedro Lauria

Em 2050 será conhecido como o maior roteirista e diretor de todos os tempos. Por enquanto, é só um jovem com o objetivo de ganhar o Oscar, a Palma de Ouro e o MTV Movie Awards pelo mesmo filme.
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