CRÍTICA #2 | Desligue o cérebro para embarcar na viagem de ‘Além da Morte’
Bruno Giacobbo
|18 de outubro de 2017
Refilmagem de “Linha Mortal”, um cult de 1990, dirigido por Joel Schumacher e com um elenco que tinha Julia Roberts, Kevin Bacon, William Baldwin, Oliver Platt e Kiefer Sutherland (de volta em uma pontinha), Além da Morte (Flatliners) narra a história de cinco estudantes de medicina, de uma prestigiosa faculdade, que decidem fazer experiências post mortem. A ideia de Courtney (Ellen Page) é descobrir o que acontece naquele breve tempo em que algumas pessoas são dadas como mortas. Muitas voltam dizendo que viram uma luz branca ou parentes já falecidos, mas o que é verdade? Para isto, ela pede a ajuda de Jamie (James Norton) e Sophia (Kiersey Clemons) para um experimento arriscado, no calar da madrugada: parar seu coração por um minuto e com o auxílio de um tomógrafo registrar as atividades cerebrais neste período. O passo seguinte, claro, é ser ressuscitada. Acontece que o procedimento não sai como o imaginado e eles acabam recebendo a ajuda de Marlo (Nina Dobrev) e Ray (Diego Luna).
Com direção do dinamarquês Niels Arden Oplev, o mesmo de “O Homem que Não Amava as Mulheres” (2009), este filme é uma mistura de ficção científica, com thriller psicológico e horror, embora, o marketing em torno de seu lançamento insista no erro de retratá-lo meramente como terror. De qualquer forma, a raiz do problema desta obra, que parte de uma premissa bastante interessante, passa por esta exótica congruência de gêneros e subgêneros. A primeira metade é fascinante e tensa, uma daquelas tramas que fisgam, logo de cara, a atenção do público. Durante as experiências (Courtney não é a única a ser submetida ao experimento), temos lindas tomadas aéreas da faculdade, das avenidas mais próximas e de outros lugares não identificados. É como se estivéssemos vagando pelo mundo com os protagonistas que deixaram, por instantes, seus corpos. Alguns acabam tendo, também, vislumbres de lembranças que estavam escondidas no fundo do cérebro. Até aí tudo bem. O problema vem depois.
Já recuperados e de volta ao batente, os cinco estudantes apresentam ganhos incríveis que vão desde o aumento da capacidade de memória até a descoberta de habilidades desconhecidas. No entanto, com o passar do tempo, eles começam a ser assombrados justamente pelos tais vislumbres do passado. Só que, em momento algum, a trama deixa claro se é algo sobrenatural, como chega a sugerir lá pelas tantas, ou peças aplicadas pelo subconsciente dos personagens. E esta indecisão incomoda bastante porque afeta a credibilidade da proposta do filme. Sim, eu sei que Além da Morte é uma daquelas produções que vocês precisam desligar o cérebro (neste caso, quase literalmente) para embarcar na viagem da história e isto, por si só, gera uma dúvida em relação ao que seria crível neste contexto. Contudo, mesmo histórias assim, que exijam a suspensão da descrença, precisam ser coerentes em suas propostas temáticas, algo que, aqui, é comprometido pela congruência de gêneros.
Deixando de lado tal indecisão, o que de melhor a trama apresenta em sua segunda metade, é o desenvolvimento dos dramas de Courtney, Jamie, Sophia, Marlo e Ray. Todos adquirem uma solidez que vai muito além dos arquétipos iniciais. São compostos de carne, sangue e osso. Apresentados como estudantes privilegiados que, por vezes, parecem não valorizar a chance de estar ali, eles se transformam diante dos nossos olhos quando conhecemos suas histórias. Os dramas – reais, palpáveis e críveis – somados à lição que o longa-metragem de Oplev insinua em seu desfecho, apenas reforçam a impressão de que se roteiro tivesse focado somente na ficção científica, com pitadas de thriller psicológico, e no carisma de seus bons intérpretes, excluindo totalmente o quê sobrenatural que tenta imprimir, o resultado final deste bom entretenimento poderia ter sido bem mais satisfatório.
Desliguem os celulares e boa diversão.
::: TRAILER
::: FOTOS
::: FICHA TÉCNICA
Título original: Flatliners
Direção: Niels Arden Oplev
Elenco: Ellen Page, Nina Dobrev, Diego Luna, James Norton, Kiersey Clemons, Kiefer Sutherland
Distribuição: Sony
Data de estreia: qui, 19/10/17
País: Estados Unidos
Gênero: terror
Ano de produção: 2016
Classificação: 14 anos
Bruno Giacobbo
Um dos últimos românticos, vivo à procura de um lugar chamado Notting Hill, mas começo a desconfiar que ele só existe mesmo nos filmes e na imaginação dos grandes roteiristas. Acredito que o cinema brasileiro é o melhor do mundo e defendo que a Boca do Lixo foi a nossa Nova Hollywood. Apesar das agruras da vida, sou feliz como um italiano quando sabe que terá amor e vinho.
